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As empresas estão jogando dinheiro fora. As pessoas não entendem a maioria das propagandas.

Eu não pensei em escrever sobre esse tema, mas fiquei motivado com a matéria “Está difícil atrair a classe C” publicada na edição da Exame que está nas bancas (edição 1002, ano 45, n. 20), que aborda as dificuldades enfrentadas pelas grandes empresas brasileiras para criar produtos e estratégias bem-sucedidas para essa nova classe C emergente no país. Uma pesquisa feita pelo instituto Data Popular evidencia que as empresas não estão preparadas para atrair esse contingente de 100 milhões de novos consumidores. A matéria cita que os erros mais comuns nas estratégias das empresas estão relacionados ao produto, à distribuição e à comunicação.

Marianna Aragão, autora da matéria, escreveu:
Empresas com tradição entre os consumidores das classes A e B e que agora tentam conquistar os emergentes não podem simplesmente acreditar na força da marca e usar as mesmas estratégias de comunicação para conquistar os novos clientes.

Foi impossível não conectar essa matéria com o que ouvi no MaxiMídia, dias atrás, na palestra “A base da pirâmide, sem preconceitos“, dada por Ratinho (ele mesmo! o apresentador da TV!), e muito bem moderada por Regina Augusto, do Meio&Mensagem. A mensagem de Ratinho para os marqueteiros e comunicólogos na plateia foi muito dura.

Ele começou a palestra já se posicionando:
Eu não gosto de falar Classe C. Prefiro dizer povo brasileiro, pelo qual sempre torci pelo sucesso e tenho muito orgulho de ver que agora têm dinheiro no bolso para comprar”. E emendou com uma pequena história: “Outro dia eu estava em um avião e a aeromoça disse que tínhamos que aguardar a decolagem porque tinha acontecido um overbooking. Uma senhora, que estava ao meu lado, me olhou assustada e perguntou: o que aconteceu, moço? Esse avião tá com defeito? Porque se tiver, quero descer“.

Ratinho usou essa história e vários outros exemplos para afirmar que as empresas não estão sabendo se comunicar com a classe C: “Vejo muito o uso de palavras como voucher, overbooking, check-out, delivery… mas muita gente não sabe o que isso significa. Isso deve acabar. Não concordo com a justificativa de que algumas marcas usam uma linguagem mais sofisticada porque querem focar um certo nicho. Isso é besteira. Nicho é querer vender menos? Só se for assim“.

Segundo Ratinho, muitas vezes o povo não entende o que as empresas falam. Existe um problema sério de comunicação.

As empresas estão jogando dinheiro fora. As pessoas não entendem a maioria das propagandas“.

O povo não entende o que a TV fala. O grande dilema é que a TV acha que o povo é que tem que se adaptar a ela“.

Propaganda popular tem que repetir as coisas até as pessoas perceberem que o preço é bom. O nível médio escolar das pessoas do povo não é muito alto, muitas vezes eles não entendem o que uma propaganda mais elaborada quer dizer. Mas tem muita empresa brasileira que prefere fazer tipo e falar com as classes A e B“.

Nós, brasileiros, entendemos na voz, mas temos dificuldade com a escrita. Tem que repetir, repetir e repetir. A Magazine Luiza e as Casas Bahia repetem os preços para as pessoas saberem, guardarem“.

Você vai a Campinas, vai viajar na Azul. Aí você vê aquela confusão em Viracopos. Aeroporto cheio, criança correndo, confusão, É o povo viajando. Você vai na Europa, lá é todo mundo quietinho, com respeito. Esse é o nosso povo brasileiro. As empresas têm que falar com esse povo. Tem que saber falar“.

O depoimento do Ratinho no MaxiMídia reforça estupendamente a matéria da Exame.
A comunicação das empresas para a nova classe emergente parece não estar funcionando. A força da marca não garante a preferência desses novos consumidores. A linguagem tem que ser mais simples, acessível e interativa. A repetição é importante. O uso do inglês tem que ser bem pensado.

Na sexta passada, depois de ler a Exame, eu conversei com um executivo de marketing de uma das grandes empresas do país que tem investido fortemente em publicidade e comunicação para a classe C. É meu amigo pessoal. Comentei sobre as coisas acima. Ele se posicionou da seguinte forma:

“Lembra do Joãozinho Trinta da Beija-Flor? Ele disse: quem gosta de miséria é intelectual, pobre gosta de luxo. Eu concordo com ele. O povo quer crescer. O povo quer sonhar. O povo quer ser tratado hoje como ele imagina ser no futuro. Eu quero ajudar as pessoas a realizarem seus sonhos, a se sentirem mais dignos, mais sofisticados e crescerem. A publicidade e a comunicação tem que ajudar nisso, ou, tem que representar isso. A história da senhora contada pelo Ratinho é muito boa. Em vez de evitarmos o uso da palavra overbooking, porque não ensinamos essa palavra e várias outras para ela em sua primeira viagem? Daí, quando ela tiver a segunda viagem, essa mesma senhora vai usar apropriadamente a palavra check-in ela vai se sentir realizada e incorporada em outra realidade. Ela terá crescido, se sentirá mais feliz e confiante de estar conquistando o seu sonho. Acho que temos um papel de viabilizar o crescimento e a evolução de todos, em qualquer classe social. Temos que puxar para cima, falar de forma popular, mas puxando. A comunicação está mudando. A publicidade é apenas parte do desafio. Ainda temos as mídias sociais, a comunicação via internet, dispositivos móveis, uma nova geração que quer falar com a empresa de forma diferente, etc. Publicidade é apenas uma parte e, quer saber? É cada vez menos importante frente as outras coisas.”

Enfim, para reflexão..