A compra da Sadia pela Perdigão cria um gigante da alimentação no Brasil. A BRF Brasil Foods terá faturamento de R$ 25 bilhões e 120 mil empregados. Será a maior processadora de carne de frango e a maior empresa de alimentos industrializados do planeta, a terceira maior exportadora do país e a maior empregadora privada do Brasil. Sadia e Perdigão, juntas, responderão por aproximadamente 80% do mercado brasileiro de produtos congelados, 57% do segmento de industrializados de carne e 67% das vendas de margarinas. Por outro lado, a nova empresa já nasce com dívidas de R$ 10 bilhões, sendo que R$ 4 bilhões vence em 2009. Ou seja, é uma empresa de superlativos, cujo nome representa bem o tamanho da empresa que alimenta o país. No segmento de alimentação, em tamanho, ela só perde para a JBS Friboi.
Segundo dados dos relatório anual 2008 das duas empresas, a Sadia mantinha 17 unidades industriais próprias e 12 centros de distribuição no País. Já a Perdigão operava 25 unidades industriais, 15 fábricas de lácteos e 28 centros de distribuição no Brasil. A capacidade instalada das duas empresas para abate de aves é hoje de 1,7 bilhão de cabeças por ano, e para abate de suínos é de 10 milhões de cabeças por ano. Se considerarmos a população brasileira, é praticamente 10 frangos para cada cidadão, por ano.
Estamos vivendo uma era de fusões relevantes e nada disso sinaliza que vai parar. É o Santander e Real, Gol e Varig, Itaú e Unibanco, Oi e Brasil Telecom e por aí vai. Fico sempre interessado quando dois gigantes se juntam, particularmente em ver como eles vão gerenciar as suas marcas, trabalhar o marketing e gerir a fusão de duas culturas. Isso me interessa muito e fico sempre com o radar ligado.
A Perdigão e a Sadia deram o primeiro passo direitinho. Na manhã de 19 de maio, as duas empresas, quase que simultaneamente, anunciaram através de ações de comunicação interna a criação da nova empresa. Ou seja, os funcionários não foram surpreendidos ao ler os jornais, apesar que a boataria a respeito da negociação das empresas já rolava solta na mídia nas semanas anteriores.
As duas empresas soltaram comunicados para o mercado no próprio dia 19 de maio. No entanto, diferentemente do que aconteceu com Itaú e Unibanco, a Perdigão e a Sadia soltaram comunicados com textos e formatos diferentes, evidenciando uma falta de entrosamento entre as duas empresas. A percepção é que essa junção de empresas não será fácil.
Juntar as duas empresas não será algo tradicional. São culturas diferentes. Gaulia, em seu blog, citou as missões da Sadia e da Perdigão: Sadia: “Alimentar consumidores e clientes com soluções diferenciadas“. Perdigão: “Participar da vida das pessoas, oferecendo alimentos saborosos, de alta qualidade e a preços acessíveis, em qualquer lugar do mundo“. Tenho que confessar, plagiando a pergunta do Gaulia, que tenho dificuldade de entender o que são soluções diferenciadas em alimentação. Olhar as missões acima mostra que existe uma diferença enorme de inspiração das duas empresas, ou então uma delas escreveu a missão de forma rapidinha…
Enfim, existem diferenças grandes entre as duas. A experiência mostra que, quando duas empresas se juntam, quase sempre o DNA de uma prevalece sobre a outra. São raros os casos de duas empresas que se juntam e criam verdadeiramente uma terceira empresa, com DNA próprio, e melhor do que as duas anteriores. O cenário piora quando a fusão diz respeito a empresas que eram tradicionalmente arqui-inimigas, desde que nasceram. Como fazer os funcionários sentarem na mesma mesa para conversarem? Como criar um clima de união se até minutos atrás valia dedo no olho e chute na canela? Alguém acredita que os funcionários da Perdigão consumiam produtos da Sadia e vice-versa? Enfim, não vai ser fácil…
Uma visita aos sites da Perdigão e da Sadia já mostra que elas são empresas diferentes. As diferenças de gestão e estrutura são conhecidas. Políticas internas de bônus, participação nos resultados e políticas administrativas são bem distintas. A Sadia mantém 23 diretores em cargos estratégicos e de decisão, já a Perdigão tem apenas dez (dados da Isto É Dinheiro). No entanto, as duas têm data de nascimento próximas. A Perdigão foi fundada em 1934 e a Sadia em 1944.
O assunto da “fusão”, por enquanto, está no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Caberá ao Cade aprovar ou não a união das empresas. Até que seja conhecida a decisão, o que pode demorar até 2010, as marcas das empresas continuarão separadas. É bom lembrar que existem outras marcas conhecidas dentro dessa nova empresa, como Batavo, Elegê, Doriana e outros. À primeira vista, parece inteligente manter as marcas Sadia e Perdigão, já que ambas ocupam posições de destaque nos principais rankings de marcas mais valiosas no Brasil. Saber trabalhar com essas marcas poderá ser um diferencial estratégico importante. Um bom exemplo disso é a AMBEV, que trabalha muito bem as marcas Brahma, Skol e Antartica, entre outras.
Uma coisa é certa. As duas empresas têm linhas de produtos muito parecidas, existe uma clara sobreposição. O nível de endividamento é assustador e a sinergia das operações é evidente. Eficiência operacional e ganhos de escala e sinergia serão prioridades evidentes. Ao juntarmos tudo isso, verificamos que os cortes de pessoas serão inevitáveis. É uma conclusão mais que do que óbvia.
As duas empresas trataram logo de colocar um filme institucional no ar, estrelado por Marieta Severo, que passa credibilidade e confiança ao principal cliente da BRF, a dona de casa. Aliás, a Dona Fernanda, dona de casa e minha mãe, já disse que os produtos da Perdigão são melhores que os da Sadia. Dona de casa sabe das coisas. Eu sou fã da salsicha hot-dog da Sadia.
Vamos acompanhar a união do “Se é de coração, é de verdade” da Perdigão com “Por uma vida mais gostosa” da Sadia. Ou, se você preferir, com a “Nem a Pau, Juvenal”. Aliás, será que o Juvenal vai sair de cena?