Texto publicado na CRN Brasil
Imagine o seguinte. Você está caminhando num dos corredores da empresa onde trabalha, que normalmente é um lugar limpo e organizado; daí, você vê um papel de bala jogado no chão. Pergunta: Você se agacha, pega o papel e joga no lixo? Você passa direto pensando que alguém da limpeza vai tratar disso mais tarde? Ou você nem liga, não dá a mínima, nem pensa nada?
Veja os dois casos que aconteceram comigo na semana passada.
Cena 1
O prédio onde eu trabalho, em São Paulo, tem duas recepções físicas diferentes, bem amplas e distantes entre si, permitindo que os visitantes cheguem e entrem por qualquer uma das duas portarias, conforme a conveniência de cada um.
Na quarta-feira passada, eu cheguei bem cedo ao trabalho, por volta das 7h15 da manhã. Ao chegar à portaria B, notei que havia um rapaz parado no balcão da recepção esperando para ser atendido. Parecia ser um visitante. No entanto, não havia recepcionista. A recepção, por algum motivo, estava vazia.
Daí, pensei: “Opa, pode ter uma boa história aí”. Então, decidi sentar no sofá da portaria para ver o que iria acontecer. Pensei: “Vou tirar cinco minutos para aprender alguma coisa com essa situação”.
Nos cinco minutos seguintes, eu contei 18 pessoas que passaram pela portaria. Todos eram funcionários que portavam seus crachás e passavam automaticamente pelas roletas. Mais ou menos metade deles olhou para a mesa da recepção e para o visitante “abandonado”, com o umbigo encostado no balcão, aparentemente sem saber o que fazer. Todos viram a situação e seguiram em frente, sem mudar a direção. Sabe aquele lance em que você vê uma situação, olha para ela e continua andando sem desviar um milímetro de sua caminhada? O máximo que faz é virar a cabeça.
Ninguém deu “bom dia”.
Enfim, foi isso o que aconteceu. Findo o meu experimento incidental, eu fui lá falar com o visitante. Descobri que ele era um funcionário novo que havia esquecido o crachá e não conseguia entrar no prédio. Aquele era o seu segundo dia de trabalho. Ele estava meio perdido. Ajudei ele a entrar, levei-o para a outra portaria, onde foi feito um crachá provisório. Procurei a segurança do edifício, expliquei que a recepção B estava sem ninguém e fui informado de que deveria ter uma recepcionista a partir das sete da manhã naquele local. A segurança, que por algum motivo ainda não sabia do problema, criou uma solução provisória e, em três minutos, o caso estava resolvido. A portaria B havia voltado a ficar operacional.
CENA 2
No mesmo dia, no meio da tarde, eu chego num determinado andar do prédio e vejo a secretária ajeitando um quadro na parede. Alguns metros atrás, eu vejo um outro funcionário olhando e ajudando a secretária na tarefa. Ela fala: “E agora? Ficou bom? Eu vou chamar o pessoal da manutenção de novo. A gente ajeita o quadro e ele volta a ficar torto”. Em resumo, eram apenas duas pessoas ajeitando um quadro grande na parede.
Por que contei essas histórias? O que existe de interessante em casos aparentemente corriqueiros como estes?
A resposta é simples: de maneira geral, em quase todas as empresas, é fundamental desenvolver o “senso de propriedade” nos funcionários. Infelizmente, a maioria deles não se sente responsável pelo dia a dia da empresa, não tem uma sensação genuína de pertencimento e não se vê como co-responsável no estabelecimento do clima interno.
Podemos dizer que o “senso de propriedade” é oriundo da combinação de três sentimentos: orgulho, pertencimento e realização. É essa trinca que dá o click no funcionário quando ele vê o carpete solto no corredor da empresa e chama a manutenção para consertar, que liga para o departamento de Compras e sugere um fornecedor que parece apropriado para a empresa, que ajeita um quadro torto na parede ou que olha um visitante “perdido” na recepção e vai lá ajudá-lo. É com esse comportamento que se constrói uma comunidade. Esse é o primeiro passo para ter colaboradores mais comprometidos e engajados pelas causas da empresa. Todos têm que sentir que fazem parte de um todo e que as suas pequenas ações somadas é que fazem a diferença.
Infelizmente, na maioria das vezes, os funcionários imaginam que alguém vai resolver o problema. Em vez de tomarem a iniciativa, eles assumem que não é responsabilidade deles agir nas pequenas coisas ou causas, muitas vezes até reclamam para os colegas nos corredores, colocando-se no papel de críticos e rabugentos.
Enfim, esse é um desafio e tanto para as empresas. As pessoas estão mais individualistas e a nova geração não enxerga mais o trabalho como as gerações anteriores. Tudo é mais corrido, imediatista e passageiro. Estamos com menos tempo para enxergar os detalhes e para gastar energia com coisas “menos” importantes. Cabe aos gerentes o papel de reconhecer esses pequenos gestos e perceber os colaboradores que realmente colaboram. Criar esse clima de camaradagem e contribuição é muito saudável e os gerentes desempenham papel importante nisso.
Mas criar senso de propriedade também exige algumas contrapartidas da empresa. Ela tem que ser mais transparente, reconhecer suas limitações, criar canais de diálogo com os funcionários, falar de suas fraquezas e deficiências, se comprometer com melhorias e aceitar críticas e sugestões de maneira natural. Essa relação franca e aberta é que vai criar a base para os funcionários serem mais participativos e co-responsáveis. Os funcionários têm que se sentir “proprietários” do local onde trabalham.
Será que as mídias sociais ajudam?