Encontre o seu inimigo. O artigo “Complicação embasada também é complicação“, de André Kassu, publicado no Meio&Mensagem, me perturbou bastante. Ele analisou a palestra de Pete Favat, CCO da Deutsch Los Angeles, que disse que todos os grandes trabalhos em marketing sempre têm um grande inimigo declarado, e citou alguns exemplos.
Imediatamente me caiu a ficha. A conexão com minha vida profissional foi inevitável. Desde os primórdios da minha carreira em vendas e marketing, passei a acompanhar os movimentos dos nossos concorrentes. Nas diversas posições que ocupei, em várias empresas diferentes, nós sempre fizemos longos PPTs analisando o que os concorrentes estavam fazendo.
Pesquisas, estudos detalhados, exercícios de futurologia, reza forte e muitas noites sem fim consumiram meu tempo e de meus colegas na vã tentativa de entender as ações dos concorrentes, de onde vinham e o que estava por trás daqueles movimentos suspeitos, às vezes inexplicáveis, que faziam. Bastavam lançar algo diferente e lá íamos nós estudar como contra-atacar.
Encontre o seu inimigo. O inimigo natural, para qualquer marqueteiro, é o seu concorrente. O que parecia ser simples no passado, porque os concorrentes eram notoriamente conhecidos em qualquer indústria, virou um pesadelo nos dias atuais. Vivemos uma época onde todos competem, o concorrente vem de onde menos se espera. Pode ser aquele aplicativozinho, sabe?
Nós encarávamos os concorrentes como inimigos a serem batidos. Muitas vezes gastávamos mais energia olhando os concorrentes do que o tempo investido nos clientes. Puxa, que erro flagrante, hein? Isso já é coisa de passado. Hoje eu não gasto muito tempo olhando o concorrente como antigamente, até porque o concorrente de hoje não necessariamente foi o concorrente de ontem, e muito menos será o de amanhã.
A grande questão é que olhar obsessivamente para o concorrente nem sempre é uma boa estratégia. Olhar o concorrente indica uma forte tendência de segui-lo, de repetir movimentos, de ir para onde os outros vão e não exatamente para onde os clientes desejam ir. Olhar o concorrente é não inovar, é seguir o curso do rio.
Encontre o seu inimigo. Então, afinal, quem é o seu inimigo? Ou, qual é o seu inimigo? Você pode até não aceitar, mas quase sempre o nosso maior inimigo somos nós mesmos. Estou falando da nossa capacidade de inovar, pensar diferente, abandonar dogmas e crenças, empreender em áreas que não dominamos e tomar riscos. Nós somos impelidos, conscientemente ou não, a fazer coisas e repetir fórmulas passadas que deram certo. Já sei! A sua reação agora foi: “pô, lá vem esse cara com o papo velho de inovação e empreender”. Parece mais do mesmo, e talvez até seja, mas o fato cristalino é que nós, como seres humanos, temos uma tendência enorme de desviar dos problemas reais e, às vezes, nem os vemos.
A maioria de nós segue o fluxo do rio. Deixamos a rotina da vida, pessoal e profissional, nos levar para onde a água corre. Temos grande dificuldade de desviar do rio da vida, de criar momentos e oportunidades de mudança de curso, de estabelecer metas individuais arrojadas e até desconfortáveis para nós mesmos.
Quer mudar ou fazer um upgrade de carreira? Se inscreva num curso legal, rala um coco, desenvolva um novo networking, ou seja, estabeleça condições para que a sua vida profissional realmente mude. Cansou da vida? Tira uma licença e vai fazer um intercâmbio. Quer abrir a mente e aprender coisas novas? Vai estudar ou ler livros de filosofia… ou culinária. Se permita conhecer coisas realmente novas. E aquele sonho de aprender a tocar violão?
Encontre o seu inimigo. Temos o cacoete indecente de fazermos sempre as mesmas coisas, especialmente aquelas que nos dão conforto e segurança, que não nos causam problemas. Alguns chamam isso de hábito, mas são vícios. Entregamos ao acaso as oportunidades de algo novo surgir. Quando aparece algo inesperado em nossas vidas, nós nos surpreendemos porque não foi algo intencional ou planejado.
A sua carreira está ruim? A sua vida pessoal está chata? Você sofre ao imaginar que em cinco anos a sua vida estará igual a de hoje? Não tem problema. Essa sua insatisfação é momentânea. Daqui a pouco você estará com amigos tomando uma cervejinha, vai reclamar do trabalho, do chefe, da vida e do país. E continuar esperando que os acasos da vida mudem essa sua perspectiva, afinal, a vida é uma caixinha de surpresas.
Nem sempre o seu inimigo é aquele que você vê. Por mais que possa parecer retórica ou bobagem, a verdade nua e crua é que quase sempre o seu maior e pior inimigo é você mesmo.