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Meu pai faleceu mas as empresas ainda querem falar com ele



Tem algo incrivelmente errado acontecendo nos serviços de atendimento e relacionamento de muitas empresas. Para evidenciar isso, compartilho abaixo as minhas experiências recentes.


Meu pai faleceu de covid no início de setembro de 2021. Imediatamente tratei de agir para cancelar contratos, serviços e assinaturas em nome dele.


Liguei para o Jornal O Globo. Informei o óbito de meu pai e pedi cancelamento da assinatura. Depois de insistirem muito na transferência da assinatura para alguém, finalmente eles aceitaram. Ao longo das seis semanas seguintes o jornal fez mais de uma dezena de ligações telefônicas querendo falar com meu pai diretamente, propondo a reativação da assinatura antiga ou uma nova assinatura em condições especiais.


Em determinado momento, O Globo enviou um email para o meu pai, que se chama Ary, com a seguinte mensagem:


Olá, Ary! Percebemos que você cancelou a sua assinatura do jornal impresso. Gostaríamos mais de saber o motivo do seu cancelamento e o que poderíamos fazer para melhorar nesse momento especial que estamos vivendo. Conte pra gente. Clique e responda”.


Eu fiquei perplexo com essa mensagem, já que meu pai havia falecido semanas antes e eu mesmo havia pessoalmente falado com O Globo por diversas vezes confirmando o óbito.


Pensei na seguinte resposta, escrevendo em nome de meu pai:


Prezado O Globo. O motivo do cancelamento da minha assinatura do jornal impresso é que eu morri. Sinto muito por não ter anunciado tal fato com antecedência. O que podemos fazer para recuperar a assinatura do jornal é vocês me ressuscitarem. Aguardo ansiosamente. Ary”.


A segunda experiência foi com a Net/Claro.


Eu liguei para Net e cancelei imediatamente a assinatura. Foi rápido e eficiente. Na semana seguinte eles recolheram os equipamentos. O curioso é que duas semanas depois chegou um email dirigido ao meu pai, com nome completo, com a seguinte mensagem:


Olá, Ary. Esperamos que esteja bem. A Claro quer ouvir você! Você cancelou sua assinatura e isso nos deixa tristes. Mas se puder responder essa pesquisa e nos contar os motivos, vai ajudar muito a melhorar nossos serviços. Topa participar? Se sim, é só clicar no botão abaixo”.


Pensei na seguinte resposta para Net/Claro.


Olá, Net. Mando lembranças aqui do além para todos. Espero que estejam bem, já que eu não estou tão bem quanto vocês, porque eu morri, conforme eu já havia informado para a Net semanas atrás. Vocês me dizem que querem me ouvir, mas isso é impossível. Sinto muito por ter causado tanta tristeza a vocês pelo cancelamento da assinatura, mas não foi proposital. Infelizmente eu não consigo responder a pesquisa de vocês porque eu não consigo clicar no botão abaixo, afinal, estou em outra dimensão. Mas tenho uma sugestão para melhorar os serviços de vocês: parem de enviar mensagens para clientes falecidos. Recebam meu abraço aqui do reino dos céus. Ary”.


E, finalmente, chegamos na terceira experiência. Dessa vez com a Oi.

Eu liguei para Oi e transferi a conta para a minha mãe. Fiz isso nos dias seguintes ao falecimento do meu pai. Semanas depois foi enviado um email para o meu pai, dirigido para o nome completo dele, informando do envio da conta e sugerindo que ele mude para a conta online. E, como ocorrido nos casos anteriores, foi sugerido que ele acionasse um link.


No caso da Oi, eu nem pensei em resposta.


Existem outras experiências, mas as três acima já são suficientes para mostrar que existe algo grave ocorrendo nas plataformas de relacionamento e atendimento aos clientes em algumas grandes empresas. Isso fica ainda mais surpreendente no meio de uma pandemia, quando centenas de milhares de pessoas no país partiram dessa vida em função da pandemia. Mais do que nunca, as empresas precisam demonstrar respeito e solidariedade aos seus clientes e consumidores.


Cabe dizer que eu não estou chateado com O Globo, Net e Oi. Entendo que nada foi feito propositalmente. O que descrevi são falhas de processo, mas reconheço que as mensagens acima podem ser perturbadoras para muitas pessoas, pois causam dor e desconforto.


Meu intuito aqui, através desse artigo bem-humorado, é fazer um alerta para as empresas em geral. Apesar da forma irônica com que encarei tudo isso, eu confesso que não me diverti. Em vez de mensagens perguntando o motivo do cancelamento, eu preferia ter recebido mensagens de conforto e condolências. Enfim, é preciso que as empresas tenham mais cuidado e atenção na forma como tratam os seus clientes falecidos, especialmente na época em que vivemos.


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