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Eu decido os meus sucessos e fracassos


Em uma das encruzilhadas do Caminho de Cora Coralina em Goiás

Nós passamos meses planejando e preparando aquele megaevento, nos mínimos detalhes. Foi, o maior evento da empresa no ano, para mais de 3 mil pessoas, incluindo dezenas de palestras, muitas delas simultâneas, em palcos diferentes, multi-idiomas, com áreas de exposição, compromissos com a imprensa e universidades, uma área com parceiros de negócios e dezenas de atividades paralelas rolando simultaneamente.


Chegou o dia! O evento aconteceu lindamente… na parte da manhã. Porém, na parte da tarde, as coisas mudaram dramaticamente.


Às 14h, aproximadamente, a energia elétrica do centro de convenções começou a oscilar. Os circuitos desligavam e religavam de forma aleatória. No momento mais importante do evento, o pavilhão parecia ter se transformado em uma discoteca, com luzes piscando por todos os lados, microfones ligando e desligando quando bem queriam, tudo ao saber de uma pane elétrica gigantesca. Ninguém sabia muito bem o que estava se passando. A concessionária de energia informava que o fornecimento de energia estava normal.


Os palestrantes, apresentadores, demonstradores, todos tentaram contornar a situação com criatividade, procurando superar as dificuldades com otimismo e com os recursos possíveis. Houve boa vontade de todos, inclusive dos clientes e parceiros.


O presidente da empresa chegou a dançar moonwalk no palco principal na tentativa de distrair a plateia e levar as coisas com bom humor. Foram 60 minutos de “quase” caos total. A situação se normalizou ao redor de 15h, quando tudo, magicamente, voltou a funcionar.


Nem tudo parecia perdido. Porém, a verdade é que depois da longa agonia, a experiência excepcional que planejamos para todos naquele evento havia naufragado sem piedade. O evento voltou a funcionar, porém o copo de cristal já estava rachado, impossibilitando qualquer brilho ou encantamento.


Mais tarde, já à noite, descobriu-se que o enorme transformador elétrico da subestação do centro de convenções havia entrado em colapso naquele intervalo de tempo, o que provocou a intermitência no fornecimento de energia elétrica. Aconteceu o que parecia praticamente impossível de acontecer. Não havia equipamento backup ou qualquer alternativa para contornar aquele acontecimento.


Eu era o líder de marketing da empresa, portanto, o principal responsável pelo planejamento e entrega daquele projeto de evento… era eu e minha equipe, junto com um grupo de parceiros e fornecedores de alta competência e qualidade.


Quando o evento terminou, respiramos aliviados, tal qual um jogo de futebol onde o nosso time está perdendo impiedosamente do adversário. Nos abraçamos, nos lamentamos, rolavam sentimentos controversos por todos os lados. Sensações de frustração entremeadas por alívios de sobrevivência ao caos, tudo temperado por um intenso amargor por considerarmos que nem tudo havia sido devidamente planejado.


Havíamos trabalhado meses e meses. Era para ser o maior e melhor evento da história da companhia. E aconteceu aquilo.


Um dos principais diretores da empresa virou para mim e falou: “O que importa é o resultado. Não importa o esforço e o brilhantismo do seu trabalho e da sua equipe. Se o resultado não veio como esperado, então o trabalho não serviu para nada”.


O presidente da empresa, que na época era o meu chefe direto, deu parabéns para mim, para a equipe e por todo trabalho realizado. Ele reconhecia o nosso esforço, o nosso planejamento e a nossa entrega na execução do evento, mas claramente faltou entregar o principal objetivo: o resultado.


Eu passei dias… semanas… meses… muito mal com tudo aquilo, tendo que cuidar de mim e, principalmente, da moral da equipe.


No fundo eu pensava comigo: “Se não tivesse acontecido a pane no transformador do Centro de Convenções, este seria lembrado como o maior e melhor evento da história da companhia. Teria sido um sucesso. Nós trabalhamos muito, tudo estava bem planejado, nada parecia ter nos escapado. A execução estava sendo perfeita, até que algo absolutamente imprevisível, e praticamente improvável, aconteceu.”


Me lembrei desta história ao ler o post de Eduardo Matos no linkedin, dias depois da derrota do Brasil para a Croácia na Copa do Mundo. Foi impossível não fazer o paralelo.


Em um post brilhante, ele explica o VIÉS DO RESULTADO. Achei o texto tão claro e assertivo, que cometo o sacrilégio de incluí-lo integralmente abaixo, contando com a compreensão e generosidade do Eduardo. O link para o post está AQUI.


“De repente a seleção Brasileira perde e aparece um monte de gente encontrando mil defeitos: Liderança ruim! • Erro tático! • Jogadores imaturos!


Eu tenho total convicção de que se o Brasil não tivesse tomado o gol nos últimos 5 minutos, a maioria dessas pessoas estaria falando o exato oposto: Liderança exemplar! • Melhor organização tática! • Melhores jogadores do mundo!


O nome disso é VIÉS DO RESULTADO.


Se o resultado for positivo, então está tudo lindo e maravilhoso. Se o resultado for negativo, então está tudo errado.


O viés do resultado é perigoso porque é possível que sua equipe tenha um resultado excelente mesmo fazendo quase tudo errado. Talvez o mercado estava bom ou só deram sorte mesmo.


E, por outro lado, o oposto também pode acontecer: Sua equipe faz tudo certinho, mas por fatalidade do destino o resultado é ruim.


Para que uma liderança seja considerada boa é crucial que ela traga bons resultados, mas é somente no médio/longo prazo, após muitas iterações, que podemos ter uma NOÇÃO do quanto a liderança é verdadeiramente boa ou ruim.


Não seja vítima do viés do resultado.”


Mauro Segura no Caminho de Cora Coralina em Goiás
No Caminho de Cora Coralina em Goiás

A análise do Eduardo Matos é muito boa. Eu concordo com ela. O paralelo do futebol com o mundo corporativo faz todo sentido e se encaixa muito bem.


Dentro da ótica do Eduardo, o episódio do “evento fracassado” que contei na abertura deste artigo, carrega o “viés do resultado”. Se não tivesse ocorrido a “quase impossível” pane elétrica na subestação de energia, o evento seria carimbado como um evento magistralmente produzido e executado, estaríamos todos celebrando, com elogios desmedidos como: “liderança exemplar, melhor planejamento e melhor time de marketing do mundo!”. No entanto, recebemos coisas do tipo: “que pena, eles trabalharam tanto. Da próxima vez vai dar certo. Quem poderia prever o que aconteceu? Tem que planejar melhor.”


Lembro que, depois do acontecido, eu e minha equipe fizemos muitas reuniões de revisão do evento, em um nível de detalhe absolutamente animal, procurando entender e aprender com cada elemento e situação ocorrida. Mais do que o constrangimento pela falha do projeto, colocamos nosso foco no aprendizado e nas lições que emergiram de tudo aquilo.


Ao avaliar a minha vida profissional, vejo que foram poucos os momentos de sucesso e vitória. Tenho mais de quarenta anos de trabalho, onde a maior parte deste tempo foi de aprendizado, batalhas, escorregões, tropeços, dificuldades, mudanças e aperfeiçoamento. Isso tudo representou momentos de trabalho muito duro, de superação, de suor na camisa, com pouca sensação de realização, reconhecimento e conquista. Portanto, usando outras palavras e sendo mais duro comigo mesmo, posso dizer que foram momentos de derrota, fracasso, frustração, eventualmente com tristeza e lágrimas.


Ao olhar tudo isso, vejo que a minha maior vitória ao longo da vida foi a persistência de me manter caminhando, sempre olhando para frente, aceitando as dificuldades e encarando-as de frente, buscando mudar quando necessário e, principalmente, aprendendo com os tropeços e os obstáculos. Quando alguns obstáculos me pareceram insuperáveis, de alguma forma desviei de rota e parti para outro caminho.


Ironicamente, foram os momentos mais difíceis que me levaram ao crescimento. Foram as derrotas, os chefes mais complexos, os momentos de dor, as perdas e as frustrações que mais me trouxeram oportunidades de aprendizado e desenvolvimento. Aquele evento que registrei na minha vida como uma derrota, criou cicatrizes que me transformaram em um profissional mais capacitado, preparado e resiliente.


Recentemente me chegou um texto excelente do Pedro Calabrez, publicado no instagram, que fala sobre isso. Ele diz que derrotas e fracassos são mais comuns do que vitórias e sucessos. E isso não é ruim. Cabe aprendermos e evoluirmos com cada derrota ou fracasso. É tentar de novo, procurando fazer um pouquinho melhor do que antes.


Tomo a liberdade de republicar o texto do Pedro Calabrez a seguir. A publicação original está neste LINK.


“Derrotas são mais comuns do que vitórias. Fracassos são mais prováveis do que sucessos. E isso não é necessariamente uma coisa ruim.


Em 2008, eu estava comendo pizza e assistindo aos Jogos Olímpicos de Pequim na casa do meu amigo Clóvis De Barros Filho. Não lembro qual era a modalidade, mas em certo momento as câmeras estavam mostrando os vencedores no pódio. Era uma emocionante mistura de êxtase e alívio. Estavam radiantes de alegria.


Foi quando Clovão virou para mim e disse: “As câmeras enfocam a alegria, e com isso escondem a realidade de todo esporte: sempre há mais perdedores do que vencedores, sempre há mais lágrimas de tristeza do que de alegria”.


Hoje a derrota brasileira nos escancarou essa realidade. Até ontem, éramos nós que ríamos dos derrotados. De hoje em diante, os vitoriosos rirão de nós. E pelo bem da nossa saúde mental, devemos também rir de nós mesmos — e seguir em frente…


Pois é um fato inevitável: a vida ainda nos trará muitas batalhas e dificuldades. Só que isso não é necessariamente ruim. Afinal, em todas as arenas da vida, as derrotas nos ensinam muito mais do que as vitórias.


Ninguém conquista vitórias sem mastigar o amargor dos tropeços e quedas.


Mas não basta cair. É preciso aprender com esse gosto amargo. Ele é um excelente professor.


O êxito, quando atingido, é fruto de aprimoramento, de aprendizagem com fracassos e de perseverança para tentar de novo, sempre um pouquinho melhor do que antes.


Para cada lágrima de vitória, é natural: encontraremos baldes preenchidos pelos prantos da derrota. Mas não podemos esquecer que é justamente nesses baldes que reside a possibilidade de crescimento.


Que a tristeza que sentimos hoje seja o combustível do desejo de aprender, aprimorar e lutar cada vez mais fortes. Como disse o grande Stephen Hawking, “enquanto há vida, há esperança”.


Nestes tempos de dificuldade e divisão, a Copa nos uniu. A seleção brasileira nos lembrou da poderosa energia de um povo unido.”


No Caminho de Cora Coralina em Goiás

Derrotas e fracassos sempre doem muito. Porém, aos 62 anos de idade, eu aprendi a lidar melhor com as frustrações e as dificuldades da vida. Percebi que quando um caminho se fecha, outros podem se abrir, dependendo apenas da capacidade de me movimentar e aceitar mudar o curso de minha história.


Aprendi a reconhecer as minhas vulnerabilidades e limitações, aceitá-las, e buscar aperfeiçoamento. Por outro lado, também passei a identificar mais facilmente as minhas fortalezas e potenciais. A minha satisfação de vida vem da minha capacidade em navegar por estes extremos, enfrentar as ambiguidades, sem dor e lamentações, apenas com agradecimento eterno pelo que sou e ainda almejo ser. Também aprendi a brigar por pequenas vitórias cotidianas, em vez de perseguir grandes conquistas hercúleas, tendo a certeza de que a soma das partes me leva ao todo.


Por fim, o mais importante: sou eu quem decido o que são vitórias ou fracassos na minha vida diária, mais ninguém. Eu sou o único qualificado para identificar o que realmente me faz bem e me engrandece. Quando um fracasso se torna aprendizado, para mim ele se transforma em vitória. Quando sofro alguma dificuldade e sigo adiante, eu me sinto mais fortalecido e mais preparado para viver. Portanto, faço o fracasso se tornar sucesso. Ninguém mais decide isso por mim como antigamente.


Este é um exercício diário que venho aplicando a mim nos últimos anos. Ironicamente, isso inverteu os pratos da balança de minha vida.


Atualmente, eu sinto que vivo mais vitórias e sucessos diários do que derrotas e fracassos. Que seja assim, sempre!


Alto da Serra dos Pirineus – Caminho de Cora Coralina – Foto de Mauro Segura

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